sábado, 28 de novembro de 2009

A dieta dos sentidos


Foi assim que, nos últimos 25 anos, ele coordenou vários estudos sobre a relação entre o olfato e o paladar e o ganho ou a perda de peso. Os trabalhos foram desenvolvidos com sua equipe no Smell & Taste Treatment and Research Foundation, entidade fundada e dirigida por ele e com sede em Chicago, nos EUA. A última pesquisa, concluída há cerca de um ano, foi apresentada na reunião da Sociedade Americana de Endocrinologia. Hirsch pediu a 2.436 pessoas obesas ou com sobrepeso para colocarem em suas refeições uma variedade de compostos aromáticos - condensados em pequenos cristais - criados em seu laboratório. Os sabores dessas substâncias eram de queijo cheddar, cebola, molho ranch, taco, parmesão, cacau, hortelã, banana, morango, malte e amora. Um grupo controle, com 100 pessoas, não usou os compostos.
A explicação de Hirsch para esses resultados estaria na ligação entre os aromas e o centro de saciedade do corpo, localizado no cérebro. "Ao atingirem o bulbo olfativo, as moléculas do cheiro acionam também o hipotálamo, estrutura responsável pela saciedade", argumenta. Portanto, segundo sua teoria, ao aspirarmos algo bastante aromático, acionamos mais rapidamente o sistema que diz ao organismo que não é mais necessário continuar ingerindo alimentos. "Se você passa muito tempo cozinhando um molho para o espaguete, quando vai comê-lo quase sempre já perdeu a vontade porque já sentiu demais o seu cheiro", exemplifica o neurologista. O mesmo processo ocorreria quando, além de cheirosa, a refeição é saborosa. Isso aconteceria porque paladar e olfato estão intimamente associados.
No Brasil, a abordagem de usar o olfato para facilitar a dieta encontra sustentação entre vários especialistas. "O estímulo do aroma é capaz de produzir a liberação de hormônios que interferem no apetite", diz a nutricionista Kelly Fu Chen, do Centro Emex, Nutrição Orientada, em São Paulo. "O resultado é uma saciedade precoce quando o estímulo da refeição começa antes de o garfo chegar à boca", afirma a nutróloga Regina Mestre, do Rio de Janeiro. "Dessa maneira, a sensação aparece antes do que a pessoa está acostumada", completa Daniela Jobst, de São Paulo. Na opinião da nutricionista Patrícia Haiat, do Rio de Janeiro, há ainda outro efeito: "Ervas como manjericão e alecrim possuem óleos essenciais que induzem a reações como controle sobre o apetite e redução da compulsão", diz.
Na rotina de seus consultórios, as especialistas incentivam os pacientes a apostar em refeições ricas em cheiros e sabores. É o que faz, por exemplo, a psicóloga Liz Von Der Maase, 51 anos, de São Paulo. Usar os sentidos é um recurso do qual lança mão até na hora de escolher as frutas que vai levar para casa quando está fazendo compras. "Cheiro, toco no que desejo comprar", conta. Em casa, Liz recorre ao manjericão, alecrim e gengibre, entre outras alternativas, para incrementar os pratos e aumentar o prazer na hora de comer. "Acredito que fazer uma refeição é muito mais do que apenas ingerir os alimentos.
Quando não há opções que estimulem os sentidos, parece que está sempre faltando algo." No Rio de Janeiro, Wesley Faria, 23 anos, era cliente tão assíduo do restaurante Universo Orgânico, onde os pratos são cheios de ervas e temperos, que acabou se tornando gerente do empreendimento. "Os pratos me deixam saciados", diz.
A verdade, porém, é que ainda há muito a ser esclarecido nessa questão. É inegável que saborear uma refeição rica em aromas é muito mais prazeroso. Além disso, há de fato estudos - além dos realizados por Hirsch - indicando uma associação entre olfato e apetite. Um trabalho feito pelo americano John Poothulil, por exemplo, apontou um resultado interessante. Durante um mês, ele orientou sete mulheres a prestar mais atenção ao paladar e olfato no momento de degustar um prato.
Elas também deviam encerrar a refeição assim que o prazer não fosse mais tão significativo. Depois do período da pesquisa e um ano após seu encerramento, todas tinham perdido peso. "Minha hipótese é a de que os seres humanos têm um mecanismo natural que usa o paladar e o olfato para regular a quantidade de comida ingerida", disse o pesquisador à ISTOÉ. "As participantes ingeriram menos alimentos quando encerravam a refeição baseadas na satisfação sensorial."
A armadilha do açúcar
Um outro experimento, realizado na Penn State College of Medicine, nos EUA, sugere que a obesidade gradualmente torna menos sensível o paladar para doces, levando o indivíduo a consumir mais desses alimentos. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores implantaram eletrodos no cérebro de cobaias (ratos) magras e gordas para medir suas reações a vários sabores: salgado, cítrico, aguado e seis diferentes concentrações de açúcar. Eles olharam para a parte do cérebro que processa as informações enviadas pela superfície da língua. "Vimos que os ratos obesos tinham 50% menos neurônios trabalhando quando suas línguas eram expostas ao açúcar, o que sugere que eles são menos sensíveis a esse nutriente, afirmou Andras Hajnal, coordenador do estudo, publicado no "Journal of Neurophysiology".
A resposta aos sabores salgados foi a mesma em magros e gordos. "Concluímos que, se você sente menos o doce, tende a consumi-lo em maior quantidade para poder saboreá-lo mais", disse o pesquisador. "Em vez de comer menos, aumentamos nossa procura pelo paladar. E colocamos mais uma colher de açúcar no café."
O grande problema é que, por outro lado, também existem pesquisas demonstrando que quanto menos capacidade de sentir o cheiro e o sabor da refeição, menor é o ganho de peso. Isso porque a falta destes atrativos funcionaria como um fator de rejeição aos alimentos. Uma pesquisa divulgada na edição de abril do "Journal of Supportive Oncology", por exemplo, provou que o câncer e seus tratamentos podem prejudicar o olfato e o paladar. Isso, segundo os estudiosos, levaria os pacientes a adotar uma alimentação de qualidade ruim, podendo gerar inclusive uma subnutrição.

Fotos: Daniela Dacorso; Marco Pinto / Ag.istoé